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Seção Sindical dos Docentes da UFV
Operação resgata 337 pessoas em trabalho escravo e escancara racismo no Brasil

“A cor do trabalho escravo atual não difere do antigo”, sentenciou o vice-coordenador nacional da Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Ministério Público do Trabalho (MPT), Italvar Medina. Medina se referia a uma megaoperação que, somente no mês passado,  resgatou 337 pessoas em condições análogas à escravidão em 13 estados brasileiros.

A operação teve início no dia 04 de julho e os seus resultados foram informados em uma coletiva de imprensa realizada na última semana. A ação é considerada a maior para o combate ao trabalho escravo já feita no país em termos de estrutura envolvida: participaram mais de 100 auditores fiscais da Inspeção do Trabalho, 44 procuradores do MPT, dez procuradores do Ministério Público Federal, 150 agentes da Polícia Federal, 80 da Polícia Rodoviária Federal e 12 defensores da Defensoria Pública da União. A maior, em número de resgatados, foi em 2007, quando 1.064 pessoas em condições análogas à escravidão foram retiradas de uma fazenda de cana na cidade de Ulianópolis, no Pará.

Crianças e adolescentes entre os resgatados

Dos 337 resgatados nessa operação em julho, 304 estavam em trabalho rural; 27, em urbanos; e seis, em um contexto doméstico. Do total, 149 também foram vítimas de tráfico de pessoas e cinco eram crianças e adolescentes. Minas Gerais foi o segundo estado com o maior número de pessoas resgatadas, 78, atrás apenas de Goiás, com 91. Na sequência, aparecem o Acre com 37 trabalhadores e Rondônia com 27. 

A ação segue em andamento, por isso os números ainda podem aumentar. Após a conclusão dessa primeira etapa, chega a 1.178 o total de pessoas em condições análogas à escravidão resgatadas somente este ano, no Brasil,  e as vítimas têm um perfil: “as pessoas negras, historicamente, sempre tiveram menos oportunidades na sociedade de um modo geral e isso reflete nos índices de violação dos direitos humanos, inclusive, pelo trabalho escravo”, disse Medina. 

A Lei Áurea aboliu a escravidão formalmente em maio de 1888. Mas, como denunciam os movimentos de luta contra o racismo, trata-se de uma “farsa”, pois negros e negras seguiram à margem da sociedade.

Casos estarrecedores

A operação revelou casos estarrecedores. Entre eles, o de uma mulher de 37 anos, que trabalhava desde os nove, em João Pessoa (PB), para a filha da patroa da irmã, que mora em Alagoa Grande (PB). Na infância, as duas moravam nas terras do engenho de uma família. Quando os pais das meninas faleceram, a empregadora ficou com a mais velha e “deu” a outra para a sua filha. Como a fiscalização ainda está em curso, os dados dos empregadores não foram divulgados. “Isso lembra muito a escravidão colonial, em que as trabalhadoras escravizadas eram passadas entre gerações de uma mesma família”, analisou Italvar Medina.

Na capital paulista, uma trabalhadora de 61 anos estava há 31 no mesmo local, uma casa na Zona Leste, com jornada das 8h às 22h, sem férias ou descanso. Outro caso de destaque foi o de uma falsa clínica de reabilitação para usuários de álcool e drogas em Minas Gerais, que obrigava 14 pessoas a fazerem e venderem artesanato. Havia promessa de pagamento a quem cumprisse metas que dificilmente eram alcançadas, motivo de agressões e ameaças. A suposta clínica também não teria supervisão médica, psicológica, corpo de enfermagem ou plano terapêutico.

58 mil resgates desde 1995

Desde 1995, mais de 58 mil trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão em fazendas de gado, soja, algodão e café, na derrubada de mata nativa, na produção de carvão para a siderurgia, na extração de caulim e de minérios, na construção civil, em oficinas de costura, em bordéis, entre outros locais.

Essa grave situação foi tratada com absoluto descaso pelo atual governo de Jair Bolsonaro. Além de aprofundar o desmonte das ações de fiscalização do Ministério do Trabalho, o atual governo flexibilizou punições e multas a empregadores que cometem o crime. No ano passado, o presidente  declarou ser contra a Emenda Constitucional nº 81, que pune com expropriação a propriedade rural que explora trabalho escravo. Promulgada pelo Congresso em 2014, a EC 81 ainda necessita de regulamentação para definir o que será considerado trabalho escravo.

(CSP-Conlutas com edições da ASPUV)

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