STF considera inconstitucional dossiê para monitorar servidores antifascistas
O Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucionais as ações do Ministério da Justiça que investigavam servidores identificados como antifascistas. A decisão, tomada pela maioria dos ministros, ocorreu durante julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 722, impetrada pelo partido Rede Sustentabilidade.
A relatora da ADPF, a ministra Carmen Lúcia, argumentou que os serviços de inteligência não podem ser usados fora de estritos limites constitucionais e legais, sob pena de comprometer a democracia em sua instância mais central, que é a de garantia dos direitos fundamentais. “As atividades de inteligência devem respeitar o regime democrático, no qual não se admite a perseguição de opositores e o aparelhamento político do Estado (…). O histórico de abusos relatados quanto ao serviço de inteligência acentua a imperiosidade do efetivo controle dessa atividade”, disse.
Carmen Lúcia ainda defendeu que a coleta de dados, por parte dos órgãos do Sistema Brasileiro de Inteligência, para monitorar os servidores constitui desvio de finalidade: “o uso da máquina estatal para a colheita de informações de servidores com postura política contrária ao governo caracteriza desvio de finalidade e afronta aos direitos fundamentais de livre manifestação do pensamento, de privacidade, reunião e associação”.
Acompanharam o posicionamento da relatora os ministros Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Edson Fachin. O único voto divergente foi o de Nunes Marques, primeiro indicado do presidente Jair Bolsonaro ao STF, que disse não considerar que houve violação de garantias constitucionais. O outro ministro indicado por Bolsonaro, André Mendonça se declarou suspeito no julgamento, uma vez que era o ministro da justiça na época de produção do dossiê.
Relembre o caso
Em julho de 2020, o portal UOL revelou a existência de uma ação sigilosa do Ministério da Justiça que monitorava, a partir de um dossiê com informações pessoais, quase 600 servidores públicos. A ampla maioria, 579, era da área de segurança pública. Havia ainda três professores universitários. Os trabalhadores em questão eram identificados como integrantes de movimentos antifascistas.
No dossiê, havia fotos, endereços e perfis em redes sociais. O documento foi encaminhado a órgãos como a Polícia Federal e a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN). Ainda de acordo com a reportagem, também foram acionados três centros da Secretaria de Operações Integradas (Seopi), órgão do Ministério da Justiça responsável pelo levantamento, para que funcionassem como locais de troca de informações entre a pasta e policiais que poderiam vir a ser recrutados. Com essa rede, o dossiê foi disseminado pelas administrações federal e estaduais.
Segundo apurado pela reportagem, o manifesto Policiais antifascismo em defesa da democracia popular, assinado por 503 servidores da área da segurança em junho, foi a base para a produção do dossiê. O documento propunha uma aliança para derrotar o fascismo, sugerindo a participação de sindicatos, entidades de classe, movimentos populares, estudantis e culturais. A secretaria incluiu ainda os nomes de servidores que assinaram outro manifesto, este de 2016, na véspera do impeachment de Dilma Rousseff, o Manifesto de policiais pela legalidade democrática. Por fim, a eles, foram acrescidos os três professores, todos críticos à política de Jair Bolsonaro.
*Crédito da foto em destaque: Dorivan Matinho – STF
(Assessoria de Comunicação da ASPUV com informações do STF)