Mais de 90% dos servidores do INEP dizem que o órgão está sendo atacado pelo governo
Um estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) apontou que mais de 90% dos servidores do Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais Anísio Teixeira (INEP) acreditam que o governo de Jair Bolsonaro interfere nas atividades do órgão. A maioria também classifica o ambiente de trabalho como ameaçador e se sente emocionalmente esgotada.
O levantamento da FGV integra um trabalho sobre o controle político atual nos órgãos federais. O INEP foi incluído na análise depois do pedido de exoneração em massa de servidores, que denunciaram tentativas de intervenção na prova do ENEM. Participaram da pesquisa 152 trabalhadores. “De forma geral temos visto essas práticas de ataque político à burocracia acontecendo de maneira formalizada ou informal. Isso leva ao desengajamento dos servidores, sofrimento mental, burnout”, disse a coordenadora do estudo, Gabriela Lotta, ao jornal O Estado de São Paulo.
Humilhação, censura e ameaças
Cerca de 90% dos entrevistados concordam que o órgão está sendo “atacado pelo governo atual” e menos de 10% discordam que o ambiente de trabalho seja ameaçador. A pesquisa identificou no INEP casos de humilhação, constrangimento, ameaça, censura, mudança forçada de postos de trabalho, deslegitimação do saber técnico e vistoria de computadores.
A reportagem conversou também com dois servidores do instituto. Um deles é o pesquisador João Horta, que está no INEP há mais de 20 anos. Horta endossou que, na maioria da esquipes, há colegas afastados por questões psicológicas. Disse ainda que, desde 2019, alerta sobre a necessidade de automatização dos processos. Hoje, os resultados demoram em média dois anos. “Eles desconsideram os alertas técnicos e ficam preocupados em olhar a ideologia do item, fazer censura porque o texto de algo era da época do PT (…). O clima está muito difícil de trabalhar para todo mundo, as pessoas ficam com medo de comentar qualquer coisa. Mas precisamos começar a mudar isso”, afirmou.
O outro servidor entrevistado está no grupo que pediu exoneração e preferiu manter o anonimato. Ele relatou estar em licença médica por questões psicológicas.
TCU vai fiscalizar conduta no ENEM
O Tribunal de Contas da União (TCU) informou, nessa quarta-feira (01º), que vai abrir um processo para fiscalizar a conduta do INEP na realização do ENEM. A decisão foi tomada por unanimidade em plenário e atende, parcialmente, a um pedido feito por deputados federais.
O TCU vai avaliar se o processo de revisão do exame, por parte de pessoas estranhas à elaboração, segue estritamente quesitos técnicos e pedagógicos; e se as questões de segurança adotadas são consistentes e efetivamente observadas.
Pedido de exoneração em massa do INEP
Em novembro, 37 servidores do INEP pediram exoneração de seus cargos. Em uma carta, à qual o jornal O Estado de São Paulo teve acesso, o grupo alegou “fragilidade técnica e administrativa da atual gestão máxima do INEP”. Os pedidos de desligamentos alcançaram mais da metade dos cargos de coordenação do instituto.
Em entrevista concedida ao Fantástico, parte desses servidores detalhou a censura e as interferências no ENEM. Os funcionários falaram em “assédio moral”, “pressão insuportável” e em censura sobre os conteúdos. “Esse dirigente (Anderson Oliveira, diretor de avaliação da educação básica) designado pelo presidente do INEP, Danilo Dupas, foi até o ambiente seguro, fez a leitura das questões que essa equipe técnica havia montado, essa primeira prova do ENEM e solicitou a exclusão de mais de duas dezenas de questões dessa primeira versão da prova”, disse uma dos entrevistados. Essas questões eram principalmente de história.
Os servidores também relataram que um policial federal adentrou o local onde a prova é elaborada, apesar do forte esquema de segurança existente. “A gente não consegue imaginar outro esforço ou motivação que não seja intimidar servidores”, falou outro funcionário.
O Andes-SN divulgou uma nota, na qual presta solidariedade aos servidores que pediram exoneração: “tal fato, ocorrido no INEP, corrobora com as recorrentes denúncias feitas pelo ANDES-SN no que concerne às práticas nefastas do governo Bolsonaro, especialmente aplicadas nas instituições ligadas à Educação do Brasil, entre as quais os constantes cortes nos orçamentos das instituições públicas educacionais que comprometem e inviabilizam seus funcionamentos. Entendemos que a ação desses/dessas funcionário(a)s constitui um clamor para que o conjunto da sociedade perceba as ameaças ao andamento das ações do INEP, principalmente quanto à realização do ENEM que se avizinha, previsto para os dias 21 e 28 de novembro de 2021″, disse o sindicato nacional em nota que pode ser lida aqui.
(Assessoria de Comunicação da ASPUV com informações do Estado de São Paulo, G1 e Andes-SN)
Foto: Agência Brasil