Nota da ASPUV nos 60 anos do golpe empresarial-militar: por memória, verdade e justiça!
Neste domingo (31), o golpe, que instaurou a ditadura empresarial-militar, completa 60 anos. No entanto, passadas seis décadas e quase quatro da redemocratização, o Brasil ainda convive com os legados desse período tão sombrio, reflexo do descaso com os processos de justiça, verdade, reparação e preservação da memória.
Ao contrário de vizinhos latino-americanos, o nosso país não realizou o julgamento e, consequentemente, não puniu os agentes do regime pelos inúmeros crimes cometidos. Da mesma forma, não investiu em espaços e outros mecanismos de resgate da memória, o que dá margem a questionamentos sobre o que efetivamente significou a ditadura para nós, trabalhadores brasileiros.
Ainda é preciso frisar que houve torturas, perseguições, assassinatos e o esvaziamento de direitos fundamentais, como as liberdades de expressão e organização. O terrorismo de Estado também promoveu um massacre dos povos originários e camponeses, totalizando cerca de 10 mil mortes¹. O tão propagado “milagre econômico” significou, na verdade, um crescimento à custa do aumento da concentração de riqueza, das desigualdades e do endividamento. No período, o salário mínimo perdeu mais de 50% do seu valor real, o 1% da população mais rica passou a deter 30% de toda a renda brasileira e o endividamento externo cresceu 30 vezes². A cultura do medo e as práticas de tortura promovidas pelas polícias militares e até mesmo o surgimento das milícias são outra herança da ditadura, conforme apontado por diversos estudiosos da área de segurança pública³.
O resultado das falhas e omissões do Estado brasileiro está expresso também nos recentes atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. O paralelo entre o episódio e o golpe empresarial-militar foi reiteradamente feito por historiadores, ativistas dos direitos humanos e pela própria Comissão de Anistia ⁴. Punir os responsáveis pelo 8 de janeiro é, sim, fundamental, mas isso, por si só, não significará a resolução dos problemas decorrentes desse legado da ditadura. Enquanto os devidos processos de justiça, verdade e reparação não forem efetivados, essa será uma história fadada a se repetir.
Nós, enquanto sindicato, temos o dever de lutar para que o Brasil garanta o direito à memória e à verdade. Não apenas porque fomos um dos movimentos mais perseguidos e atacados pelo regime, mas por termos o compromisso fundamental de estabelecer um país justo, igualitário e soberano. E só podemos idealizar e construir o futuro que queremos, a partir do entendimento do nosso passado.
Por memória, verdade e justiça!
Para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça: ditadura nunca mais!
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Fontes:
¹ 60 anos do golpe: Estudo aponta 1654 camponeses mortos e desaparecidos na ditadura. Disponível em: <https://apublica.org/2024/03/60-anos-do-golpe-militar-estudo-aponta-1654-camponeses-mortos-e-desaparecidos-na-ditadura>.
Vítimas de tortura: indígenas ainda sentem violações sofridas na ditadura. Disponível em: <https://www.gov.br/memoriasreveladas/pt-br/assuntos/noticias/vitimas-de-tortura-indigenas-ainda-sentem-violacoes-sofridas-na-ditadura>
² 50 anos do AI-5: Os números por trás do ‘milagre econômico’ da ditadura no Brasil. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/brasil-45960213>.
³ Após 59 anos da ditadura militar, tortura policial contra a população negra permanece alimentando o genocídio no Brasil. Disponível em: <https://amnb.org.br/apos-59-anos-da-ditadura-militar-tortura-policial-contra-a-populacao-negra-permanece-alimentando-o-genocidio-no-brasil/>.
Tortura policial ainda segue modelo da ditadura, apontam especialistas. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-08/tortura-policial-ainda-segue-modelo-da-ditadura-apontam-especialistas>.
⁴ Negação da ditadura armou a bomba que levou ao 8 de Janeiro, diz Comissão de Anistia. Disponível em: <https://www.cartacapital.com.br/politica/negacao-da-ditadura-armou-a-bomba-que-levou-ao-8-de-janeiro-diz-comissao-de-anistia/>.