Mineração faz explodir casos da Covid-19 em cidades de MG
Considerado como “atividade essencial” pelo Governo Federal, o setor de mineração não parou. O resultado são milhares de trabalhadores expostos ao risco iminente de contaminação e a explosão de casos da Covid-19 nas cidades mineradoras de Minas Gerais.
Há registros de pelo menos 188 trabalhadores contaminados no início de junho, na Vale de Itabira (MG), de acordo com levantamento do Observatório da Mineração.
“Não é possível saber ao certo a situação de contaminados na Vale Itabira, porque a empresa transmite o boletim de contaminados para a Secretaria de Saúde que não o divulga especificado”, alertou o vice-presidente do Sindicato Metabase Itabira, Carlos Estevan Gonzaga, à CSP-Conlutas (central sindical à qual o Andes-SN é filiado). Em Itabira, cidade com 119 mil habitantes, ao menos 619 pessoas já foram contaminadas com um óbito confirmado, segundo boletim da Prefeitura.
A sede da mineradora no município chegou a ser notificada e interditada pelo Ministério Público do Trabalho após denúncias do sindicato de que não havia garantia de proteção aos trabalhadores. No entanto a liminar foi revertida pela empresa.
“A Vale dizia que era mais seguro estar dentro da empresa do que fora, mas na medida em que começou a implantar a testagem verificou um número alto de trabalhadores infectados, todos assintomáticos. Foi então que veio a interdição e a Vale vai ter de se adequar às exigências, que são mais rigorosas, para que possa continuar funcionando normalmente”, alertou Gonzaga.
Em Mariana (MG), com 60 mil habitantes, os números também são alarmantes. O Sindicato Metabase Inconfidentes destaca que, após a Vale ter começado a testagem nos trabalhadores, houve um aumento de quase 300% dos casos confirmados. Segundo boletim da Prefeitura do dia 24 de junho, o município registrava 535 contaminações e nove mortes.
Também chamam a atenção os números da Covid-19 em Itabirito (376 casos confirmados e dois óbitos até o dia 24), Barão de Cocais (105 até 22 de junho), e Ouro Preto (149 casos e quatro mortes até 24 de junho).
Dados que podem estar subnotificados já que até há pouco tempo as empresas não testavam os trabalhadores.
Foco de contaminação
Bruno César Teixeira é operador de equipamentos e instalações da Vale na Mina de Timbopeba, em Ouro Preto (MG), há sete anos e meio. Ele relata que as medidas de prevenção adotadas pela empresa são ineficazes. “Na troca de turno existe uma proximidade muito grande entre os trabalhadores que é praticamente impossível não fazê-lo. Existe a disponibilização de materiais de higiene, no entanto, as ferramentas e equipamentos são compartilhados, o que pode vir a transmitir o vírus. A correria da produção, muitas vezes, impede que as medidas que naturalmente seriam tomadas aconteçam”, aponta.
Bruno diz que a empresa adota protocolos como aferir a temperatura dos funcionários que chegam à empresa, “mas não há nada comprovado de que é aquele que tem febre que transmite a doença, logo, o cenário é de um ambiente impossível de conter a disseminação da doença entre os trabalhadores”.
O trabalhador alerta ainda que a empresa tem realizado testes para a Covid-19 em todos os empregados, mas aqueles que testam positivo (geralmente assintomáticos) são deixados em quarentena por apenas 10 dias e depois são reincorporados equipe sem nova testagem.
Bruno acredita ser possível e viável que as mineradoras garantam licença remunerada para os trabalhadores, no entanto, essas empresas, assim como a Vale, estão apenas pensando em seus lucros. “A Vale tem recursos financeiros para esta medida, garantindo os salários, benefícios e estabilidade. Mas sua direção está à serviço do lucro, dos investidores internacionais. Além do mais, a empresa tem reservas de minério, milhões de toneladas nos portos que ela adquiriu e construiu no Oriente Médio e na Ásia, principais compradores do nosso minério de ferro”, avaliou.
“Manter a mineração como essencial e manter as licenças de operação de empresas como a Vale e a CSN é atentar contra a vida dos trabalhadores e contra a saúde da cidade”, conclui.
Quarentena geral, já!
“É um genocídio pensado do conjunto da classe trabalhadora. E isso passa para o conjunto da população. Desde o começo da pandemia fizemos várias ações no intuito de alertar para essa situação e de proteção aos trabalhadores. O setor é essencial para quem? Só se for para os lucros das empresas”, frisa o presidente licenciado do Sindicato Metabase Inconfidentes, Rafael Ávila.
“A empresa tem condição de garantir quarentena geral para todos os trabalhadores, mas sabemos que as mineradoras, os grandes conglomerados financeiros são também dirigidos por financistas, que não se propõem a parar de forma solidária com os trabalhadores, embora tenham condição financeira de fazê-lo”, reforça o vice-presidente do Sindicato Metabase Itabira, Carlos Estevan Gonzaga. No primeiro trimestre de 2020, a Vale anunciou lucro líquido de R$ 984 milhões.
Para Gonzaga, essa lógica é fortalecida por “um governo que vive na contramão da realidade, que não tem a preocupação com a Covid-19. Eles querem passar a boiada, inclusive, com o ministro da economia dizendo que quer priorizar as grandes empresas. O governo não quer parar as grandes mineradoras, ao contrário, quer alimentar o rentismo em detrimento da vida”.
Mineração como serviço essencial
A mineração foi incluída como “serviço essencial” por meio de uma portaria do Ministério de Minas e Energia do fim do mês de março. A medida foi editada após ampla pressão das mineradoras. Dessa forma, garantiram-se as bases para que as atividades do setor não fossem interrompidas durante o período de pandemia.
Está em tramitação, na Câmara dos Deputados, um projeto de Decreto Legislativo, que quer anular a portaria. A proposta é de autoria de deputados do PSOL.
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*Crédito da foto em destaque: José Cruz/Agência Brasil
(Assessoria de Comunicação da ASPUV com base em texto da CSP-Conlutas)